Alma,

Nessa noite de hoje não consigo dormir. Meu travesseiro espeta-me como noutras vezes. Para dar mais ainda razão a essa insônia, quase já uma amiga, a minha perna dói e nada posso fazer.

Nada pude ainda hoje cedo e já nem me pergunto se poderia. Não adianta querer respostas a isso e já não me preocupa e nem me faz querer certezas. Só sei que mesmo com o peso do cansaço da luta em busca de um simples sopro de vida, não consigo dormir. Mesmo que tente.

Por mais que tenha me feito companheiro da certeza da minha morte, a sua chegada em outro ser não me faz vê-la tão facilmente. Desagrada-me sua presença, sua sempre pontual e infalível precisão.

Agora escrevendo isso, lembrei-me do velho Moshav e de coisas ali escritas sobre a morte...

“ Numa coisa não te iludas porém; não estou ainda bastante enfraquecido para ceder às alucinações do medo, quase tão absurdas quanto as da esperança, e naturalmente muito mais incômodas. Fosse-me necessário exceder-me e preferiria fazê-lo no sentido de confiar: nada teria a perder e sofreria menos.”

Por isso excedo-me a cada dia. Não posso temer. Deve ter sido isso que me fez permanecer ali, tentando em vão atrapalhar o trabalho desse ser tão indefectível.

Tive a fortuna de ter sido o mais bem tratado dos doentes e com isso ter eu apontado o dedo para essa criatura... Mas nada pode ultrapassar os limites estabelecidos. Eu não posso lutar a guerra de outros. Mesmo que acredite piamente que esses outros mereceriam todo um alvorecer, um mundo a explorar...

Sufoco!

Essa eu não tinha como evitar e é por isso que não consigo dormir.